A Internet está atrofiando nosso cérebro e estreitando nosso mundo
Ok. A Internet é, sim, a maior ferramenta disseminada nos últimos anos e ela moldou, sim, todo o planeta em um novo estilo de vida. Sem a Internet, estaríamos em uma nova era de trevas. Mas havemos de concordar que, por conta dessa graça divina que tanto otimiza nosso dia-a-dia, acabamos fazendo certos usos de forma errônea.
Eu explico.
Ao usar o Google, você usa só isso do seu cérebro (Foto: Divulgação)
Em uma recente pesquisa da Universidade de Columbia, em Nova York, a psicóloga Betsy Sparrow sugere que o Google, seu mecanismo de busca favorito que virou caixa de e-mail, calendário e rede social, pode estar realmente nos fazendo trabalhar menos para absorver informações.
"Desde o advento dos sites de busca, estamos reorganizando a nossa maneira de lembrar das coisas", disse Sparrow. "Nossos cérebros dependem da Internet para trabalhar a memória da mesma maneira que essa se lembra de um amigo, familiar ou colega de trabalho. Lembramos menos das informações porque sabemos onde a informação pode ser encontrada."
Culpa do Google? Claro que não.
Não é porque a Internet faz tudo por você que você não deve fazer mais nada (Foto: mantozauras - Lomography.com)
Usamos as ferramentas da web para otimizar nossas vidas. Hoje, os aniversários de seus amigos são avisados pela sua conta no Facebook, assim como os eventos mais interessantes (ou nem tanto) da semana. Seus compromissos de trabalho estão devidamente organizados no seu Google Calendário, que vai te mandar um aviso por email e um toque no seu celular que, claro, está sincronizado com a ferramenta.
Aquele site de legendas que você usa para sincronizar vídeos baixados em torrent informa todas as séries que foram atualizadas na rede (quantas pessoas ainda se programam para ver determinada série, em determinado canal de televisão, em determinada hora?) e o Last.fm guarda todas as músicas que ouvimos nos últimos anos, nos avisa quais os sons que estamos ouvindo bastante e quais a gente deixou mais de lado.
Pois bem. A ferramenta está aí, na nuvem, para todo mundo usufruir. Mas estamos mesmo aproveitando esse admirável mundo novo para nos desenvolver, ou apenas utilizando-o como escada rolante de um canto para outro, apenas por preguiça?
Estreitando o nosso mundo
A Internet se consolidou com a promessa de conectar o mundo todo em pessoas e pessoas para todo o mundo. Já temos a web como parte integrante de nossas vidas e, se pararmos para pensar, estamos mesmos conectados ao mundo todo ou apenas trocando figurinhas com nossos vizinhos? A nossa tendência natural de se fechar para qualquer coisa que venha do desconhecido permanece ainda na rede. Conseguimos, no máximo, expandir nossas conexões quando estamos atrás de alguma mulher. A mais, nos acostumamos a traçar uma linha dentro de um espaço conhecido e permanecer ali o máximo de tempo confortável possível. O mesmo acontece com a nossa cultura.
Para iluminar esse ponto do raciocínio, vale uma citação pinçada do PapodeHomem, de uma palestra da escritora e professora de ciência política, Elif Shakaf, para o TED Global 2010:
“Todos nós vivemos em algum tipo de círculo social e cultural. Todos nós. Nós nascemos em uma família, nação, classe. Mas se não tivermos qualquer conexão com os mundos além daquele que temos como certo, então nós também corremos o risco de secarmos por dentro. Nossa imaginação pode encolher. Nossos corações podem diminuir. E nossa humanidade pode definhar se ficarmos por muito tempo dentro de nossos casulos culturais.
Nossos amigos, vizinhos, colegas, família – se todas as pessoas no nosso círculo se parecem conosco, isso significa que estamos cercados com nossa imagem no espelho.”
Vamos retomar no raciocínio a partir daqui. Estamos colocando nossos cérebros para trabalhar menos, enquanto utilizamos a Internet para nos conectar a pessoas próximas e, para facilitar todo o nosso processo, ainda direcionamos o nosso olhar virtual para quem tem semelhanças com a gente mesmo. Estaríamos nós no fundo do poço? Claro que não. Tudo pode piorar.
O problema e a solução
Ainda na troca de ideias propiciada pelo TED, o ativista Eli Pariser palestrou sobre o assunto do seu livro, The Filter Bubble (em tradução livre, “A bolha de filtro”) que, resumidamente, fala das bolhas de informação criadas por algoritmos de grandes sites e redes sociais.
De acordo com Eli, alguns “grandes” da Internet, como Google e Facebook, estão inserindo fórmulas matemáticas que visam filtrar nossas buscas para sempre trazer as informações que mais condizem com a nossa procura. Como exemplo, ele pediu para que dois amigos acessarem, ao mesmo tempo, uma procura no Google com a palavra-chave “Egito”. Um dos amigos recebeu uma série de links sobre viagens e história do país, enquanto o outro colega, mais com perfil político, recebeu as últimas notícias sobre os protestos contra Hosni Mubarak, até então presidente do país. Veja a conversa na íntegra:
Link TED | Tem legenda em português, basta selecionar no player do TED
Estamos em um momento específico em que juntamos a fome com a vontade de comer. Temos, dentro de nós, a vontade de estar em uma zona de conforto. Adicionamos ferramentas que fazem tudo para que possamos usar menos a nossa atividade cerebral e, para fechar de vez a bolha, temos agora filtros que nos impedem de ver além do nosso mundinho.
Criamos a série “Fora da bolha” aqui no Portal Homem justamente para nos empurrar para além de nossos universos familiares. Para conhecer outros jeitos de viver, sair do edredom que nos coloca em uma posição passiva, do gueto cultural que zera a nossa capacidade de entender e absorver o outro e, mais importante, queremos que vocês tenham informações que geralmente não apareceria no seu site de busca ou na sua rede social.
E vocês? O que estão fazendo para sempre se encontrar com a alteridade, para ter seu mundinho sempre quebrado, expandido? Seguimos o papo nos comentários – e nos vemos fora da bolha.